NO DAFUNDO
Num dia de Junho de 1968, depois de vários testes, João Moisés conheceu o inolvidável privilégio de entrar a trabalhar na empresa gráfica BERTRANDO & IRMÃOS, nas instalações do Dafundo. A mesma tinha Sede em Lisboa na Travessa da Condessa do Rio, na freguesia de Santa Catarina, onde teve toda a sua actividade durante bastantes anos.
Ter pouco mais de três anos de preparação no seio de uma empresa essencialmente de zincogravuras e logo ser colocado num departamento administrativo comercial do mundo gráfico, como uma fábrica da dimensão daquela, talvez a maior do género do país, com secções de tudo o que àquela arte diziam respeito, podia ser considerado um grande feito, por quem tinha ainda havia tão pouco tinha deixado de ser trabalhador estudante, objectivamente para se valorizar.
Ainda por cima teve de provar a um examinador credenciado estar apto para o cargo!
Era também uma oportunidade, para conhecimentos mais profundos e para prosseguir a veia policial, que lhe estava consubstanciada na alma.
Foi-lhe atribuído um gabinete que passou a partilhar com um outro colega, numa estrutura composta por um director comercial, o Dr. Brás Monteiro, um chefe de secção com a sua sala própria, para receber clientes mais sofisticados, ou para tratar de assuntos normalmente complicados, mais dois colegas na sua própria sala e uma estrutura, com secretariado de apoio, de que faziam parte uma jovem senhora e um paquete.
Depois havia os chamados serviços comerciais, compostos por homens de vendas, com a sua carteira própria, também secretariados, que ficaram sempre no que se designava Sede em Lisboa.
Só aqui estava já uma grande estrutura, depois havia toda a produção no Dafundo. A Direcção tinha no comando o Dr. Manuel Metello, proveniente da empresa Celsa, concessionária das listas telefónicas, que só a BERTRAND & IRMÃOS teria capacidade de executar.
A referida firma de origem brasileira, adquirira a gráfica, cuja produção se propunha expandir para o estrangeiro, contando já com um elemento da Hungria, a viajar por vários países.
No fundo, João Moisés parecia ter um mundo para trabalhar, tudo começou duma forma aliciante, nem ele mesmo, alguma vez ousara sonhar com tão boas condições, tanto mais que em breve tinha conquistado o apreço de todos, não só com quem tinha de relacionar-se por inerência, mas também com outros, pelo menos os do se nível, pois eram esses os interlocutores naquele trabalho, que visava estabelecer a ponte entre o cliente e as chefias das secções, por onde passava cada obra.
O núcleo já apontado, tomara por essa razão o sugestivo nome de CONTACTOS e tinha de ser por ali que passavam todas as obras a executar.
Nos dois gabinetes, aos quatros cabiam outros tantos pelouros em separado; trabalhos provenientes de editoras de livros, de revistas, de agencias de publicidade e do estado.
Tudo corria bem a João Moisés pois calhara-lhe no sector de livros, o que mais gostava, tinha sido um feliz acaso.
Mal tinha ocupado aquele trabalho e logo se deu em Lisboa, na Feira Internacional, à Junqueira, a FILGRÁFICA um grande certame internacional de Artes Gráficas, a que a empresa BERRAND & IRMÃOS, como grande empresa que era, tal como se afirmara no panorama nacional e tentando expandir-se internacionalmente, não se podia alhear.
Concorreu com o seu Pavilhão e nele dispunha de uma equipa, composta de uma senhora que agenciara, um homem de vendas e outro dos CONTACTOS, a dupla comercial era revezada diariamente, como era óbvio.
Logo num dos primeiros dias, foi a vez do João Moisés a quem calhou, como companheiro o Rodrigo (que veio a revelar-se fadista de nomeada), teve a oportunidade de ouvir bastante das suas aventuras, ficando a conhecer logo a sua fascinante personalidade humanística.
Seguiram-se inúmeros e variados trabalhos, como facilmente se pode calcular: Uma das entidades que primeiro chegou com obras ao cuidado de João Moisés foi Selecções do Reader’s Digest. Manuel Bertrand, um dos Directores de vendas, veio-lhe apresentar João Bruno, da produção daquela empresa. Seguiram outras como Palirex, a Íbis, a Meridiano, a Aster, a Francisco Franco, a Férin, a Início, a Galeria Panorama, a Branco e Negro e outras, quase todas desaparecidas na voragem dos tempos.
Muita gente de nomeada foi conhecida ali e não obstante os anos passados, alguns amigos do tempo perduram, não só colegas de trabalho, como propriamente outros que representavam clientes.
As boas memórias, os livros autografados, obras interessantes manuseadas e guardadas, são testemunho importante de como chegou a disfrutar de um ambiente de trabalho de excepção.
Embora a administração tenha criado condições sociais invulgares para os operários, como por exemplo a duplicação de subsídio para os filhos, aqueles tinham sempre de, na portaria mostrar as pastas, que normalmente serviam para transportar a refeição, ou roupas apropriadas para a laboração.
Sobre trabalhos e evolução dos mesmos, reparos haveria a fazer, porque naquele ano de 1968, entravam ali operários a mais e mesmo assim, faziam-se muitas horas extraordinárias, que tinham de se considerar fora de necessidade, o que já era recorrente no meio gráfico.
Os próprios chefes pactuavam com a situação, porque estando isentos de horário, abandonavam funções a horas laborais certas, senão mesmo antes, sem nunca curarem de deixar alguém responsável, nem cobravam a ineficácia, no dia seguinte. Parecia agradar-lhe a situação, que na maioria dos casos funcionaria, como dado adquirido.
Quem trabalhava, de perto com os clientes sofria com tal desiderato, queixar-se seria perda de tempo, porque parecia descurar-se a manutenção do posto de trabalho, mesmo naquele tempo, ao invés de o estar a transformar mais próprio para um asilado.
O que devia ser considerado um meio altamente social a preservar, por todos os meios, como o deve observar-se em qualquer empresa.
Apesar de tudo, continuava a correr de feição no sector administrativo intermédio.
Daniel Costa – in JORNAL DA AMADORA
terça-feira, 12 de agosto de 2008
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36 comentários:
Olá Daniel,
Uma bela escrita, só poderia mesmo vir, de um sublime escritor. Parabéns.
Beijos,
Cris
Olá Daniel
Fiquei muito contente com sua visita e confesso q fiquei mais contente ainda ao saber q meu texto fez vc refletir.
Sempre achei a solidão algo triste, mas depois de alguns fatos que aconteceram em minha vida e alguns fatos q presenciei, mudei meu modo de pensar e vi q para ser feliz ou estar feliz vc ñ precisa do outro. Pq a felicidade esta dentro de nos e para encontrá-la devemos ser e fazer tudo que nosso coração deseja.
Beijosss e gostei de mais de seu cantinho, te add na minha lista de amigos assim poderei te visitar mais e mais vezes....
Se cuida e volte sempre no meu bloguinho!!!
Olá caro amigo
Daniel...
Um post desse, com essa emoção teria mesmo que ser escrito por uma pessoa especial e inteligente como você... Parabéns!
Daniel, você é um grande amigo
adoro a suas visitas em nosso jardim...
Boa semana
Serei sempre sua rosa amiga
grande beijos
Iana!!!
Como vc escreve bem , Daniel. Aprecio muito a sua escrita. Qualquer dia desses, vc publica um livro, mas me avise porque quero ir no lançamento. Mudando de assunto, tive que fazer outro post, pois aquele me trouxe um azar que vc nem imagina. Este é sobre um cult movie, dirigido pelo Nicolas Cage, com James Franco no papel principal. Passou despercebido no Brasil, talvez tenha feito sucesso na Europa, não sei. Apareça por aqui:
wwwrenatacordeiro.blogspot.com
Um abraço,
Renata Cordeiro
Rapaz; ao ver estes escritos, as ruas as pessoas, o trabalho, a forma de literatura que nos proporcionas, não deixo de pensar como tens tudo tão armazenado no cérebro e ainda me disseram antes de ser operada que; uma pessoa operada à cabeça nunca mais volta a ser a mesma!)Confesso que nem mais pensei nisso, e por vezes dou comigo a apetecer-me dizer à tal pessoa que se enganou redondamente!... Sinto-me intacta na memória e bem mais ligeira até...
Onde vais buscar tanta lembrança linda, nomes, ruas, firmas, apre moço, és memso letrado de todo!
Um grande abraço da laura que quer que a entendas de todo (por dentro da alma!)
Oie meu amigo lindo!Suas brilhantes narrativas, me faz sentir, como se estivesse acompanhando todo trajeto.
Boa semana! Beijos
Oi Daniel,
Tantos seus escritos como suas poesias são dignas de reverencias...
beijos
Olá Daniel, grata pela tua visita ao meu cantinho, adorei a tua narrativa... muito bem escrita, os meus parabéns!
Beijinhos de carinho,
Fernandinha
Continua interessante a tua descrição do ambiente na década de 60...
Obrigada pela visita - hoje, coloquei novo poema daquele poeta.
É um livro pequeno, mas diz muita coisa...
Beijos e abraços
Marta
Oi, Daniel!
Estás de férias? Sumiste...
Questões administrativas são complexas e não nos trazem prazer...Abração!
Oi Daniel. Dizer que você escreve super bem é como chover no molhado. Todo mundo já sabe. É fato. Só espero que consiga que seu livro seja apreciado e, então, publicado.
Mas, enquanto isso, nos deliciamos com a saga de João Moisés.
Beijos mil! :-)
Obrigada pelo comentário.
Como escreves bem! (:
Tem um quê de emoção, acho que é quando fazemos o que gostamos.
beijos ;*
Cris
Gostaria de ser o que dizes, gostaria!
Obrigado,
Daniel
Regi
Afinal também usas reflectir e mudar. Outro olhar, pode não ser igual ao nosso, mas que devemos pensar sobre ele, devemos. Podemos retirar algo, sobretudo, aprendemos a estar na vida.
Volta sempre, trocamos pontos de vista, certo?
Beijos,
Daniel
Ina
Caro amiga, gostava de ser como dizes, mas olha lentarei não desmerecer. Adoro que os amigos me considerem.
Também desejo boa semana.
Gosto de bons amigos e considero-te.
Deixo beijo,
Daniel
Como disse a colega cris no 1º comentário, vc é sublime. Parabéns...!
Renata
Estou a fazer um revisão a todo este texto cujo grupojá acabei, para propôr edição em livro. Depois espero e farei "demarches".
E porque não virias ao lançamento? seria benéfica a viagem!
Não dispenso leitura cuidada a cada um dos teus posts e passei.
Abraço e desejo solene, que caminhes bem.
Daniel
Laura
Sabes uma coisa? Como eu separo os tempos; digo depois de: intectualmente estarei melhor, talvez tambem por ter, mais disponibilidade temporal. Algumas secuelas, são de ordem motora!.
Há pouco tempo uma amiga disse, que no meu caso, quinze dias em estado comatoso 15 dias e by... by... contaram-me trinta!
Miúda não sou génio ou pensas?
De quaquer modo com os dedos no teclado, parece-me ver o passado em filme! è curioso. Ante de: Acontecia-me com esfero, nos dedos e papel a traçar rascunho.
Desculpa, entusasmei-me e falei um bocado de mim. Será das tuas belas palavras!
Pago com um beijinho de amizade.
Daniel
Menina do Rio
É tua bondade demonstrada em palavras!... Agradeço!
Beijos,
Daniel
Bandys
Pensando em ti e noutros amigos e porque gosto de receber visitas e de visitar, trarei poesia da minha. É pena não estar à altura de competir com a tua, que aprecio.
Beijos
Daniel
Olá,
excelente texto, gostei muito.
Vim agradecer sua visita em meu blogue, e confesso que gostei muito do seu.
Volte sempre, Beijinhos
*
nos meus 16 anos,
pertencia a uma organização,
cristã-progressista, em
que cristo-homem era o nosso farol,
pensei em fundar uma biblioteca,
que fosse alem das publicações
católicas, com mais três camaradas,
era assim que os jocistas se
tratavam ainda hoje nos núcleos
de antigos jocistas o fazemos,
numa atitude presencial, percor-
remos meia lisboa, contactando
embaixadas e empresas gráficas,
e digo de passagem com razoável
êxito, todo este arrazoado, para
contar um caso pitoresco, ao
tempo tinha o meu quartinho
independente, na zona de algés,
e foi na bertrand que se a cena
aconteceu, depois de recolhida
uma boa colheita de livros,
metade dos quais cortados pelo
meu amigo pároco, um trabalhador
meteu-me no bolso um pequeno
livro e ciciou vê o livro num
local seguro, era obvio que foi
visto quando á rua cheguei,
repara no titulo,
" a constituição da URSS "
ainda o guardo junto aos livros
proibidos do antes 25,
tenho outra publicação igual,
da inova - porto, após 25,
,
embora sem nexo,
veio a propósito do Moisés,
,
saudações
,
*
Moço, eu nem faço rascunhos, sai tudo daqui e as letras vão a trote, pois não conseguem acompanhar o pensamento que corre veloz qual corcel livre!...Só faço, mas apenas por vezes, um rascunho d eum poema que esteja a sair na hora, ou depende do lugar onde estiver, já me aconteceu ir a conduzir ede repentre sai dali uma letra linda, encostei o carro e como nem tinha papel, escrevi no talão do carrefour, nas costas, vá que era grande!...fiz uma bela cançoneta...
Somos como Deus nos fez e nos quer, e ainda bem que é assim... Muita saude e muitos nos de vida ainda, pois ainda somos novatos por cá, ehhhhhh. abração da laura...
qndo leio seus textos, me sinto em lisboa, é como qndo lemos aqueles livros, ricos em detalhes e que a história se passa em um lugar que nem sonhamos com é.
bjosss...
sempre um pazer ler a tua prosa
beijos
Fernanda
Gosto de entrar na partilha e as tuas palavras são estimulantes.
Obrigado.
Agrdeço o carinho e deixo beijos.
Daniel
Marta
Gosto da maneira, que imprimes aos teus posts e de tomas contacto com novos poetas.
Procuro partilhar e não desmerecer.
Um abraço com beijinhos.
Daniel
Vanuza
E no entanto, passava.
Agora já saberás!...
Desculpa!
Um abraço.
Daniel
Sorrisos
Gosto de partilhar e até sabe bem estímulos.
Obrigado, procurarei não desmerecer.
Considero os bons amigos virtuais e estás no grupo.
O João agradece!
Manda deixar uma infinidade de beijinhos.
Daniel
Carol
É um facto, como agora quis o acaso, esse deus dos loucos, sempre fiz o que gostava. Tendo mesno necessidade de trabahar para viver, é curioso, não é?
Escrevo há anos, por gosto, porém só agora posso faze-lo como me dá na gana. Antes nunca tinha disponibilidade temporal para isso.
Obrigado.
Beijos
Daniel
Hospício Político
Boa vontade!... Agradeço.
Daniel
Ana Martins
Fico grato, assim omo se também passares por aqui vezes, gosto da partilha.
Beijinhos
Daniel
Poetaeusou
A tua história é muito curiosa, mas falo da Bertrand & Irmãos, que ainda no meu tempo, mudou o nome para Imprimarte e não da Livraria Bertrand. De facto os fundadores de ambas, creio, que eram primos e tinham vindo de Espanha. Um dia ainda passou pelo gabinete, um desses fundadores, senhor Vicente Bertrand, idoso mas lúcido e bom conversador. Foi ali porque o meu colega, António Alcarás, também de descendência espanhola, tinha trabalhado ainda com ele.
A tua história tem nexo, sabes? Dizia-me: Onde te meteste; trabalhadores gráficos sáo todos comunistas!... Não era assim, mas o sindicato era o mesmo dos jornalistas e Por exemplo, era o único sector, antes do 25 de Abril, a ter feriado no lº de Maio.
Já agora, por nelas figurarem "modelos" conhecidos meus, impressas a cores, na Bertrand, para miolo de livros, tinha de ser feito no Brasil e vendidos no Brasi, porque cá a censura cortava.
Da censura aparecerá cheiro.
Obrigado por este bocadinho.
Daniel
Laura
Os meus rascunhos, eram para escrita de filatelia e os dados, fazia questão de serem certos e havia que esquematizar assuntos, ficava com um guião do artigo que ia fazer. Continuo a traçar aqui no PC, porque a fiquei a escrever pior e menos rápido, manualmente. Uma das sequelas!...
Esboçava e o artigo, manualmente, era como como se estivesse feito. Curiosamente descobri que da imaginação faz parte a ponta dos dedos, porque nas teclas produzem o mesmo efeito, com vantagens.
Sim há pensamentos repentinos, que podem passar se não ficarem registados. A mim acontece a tomar a bica, anda sempre com esfero e por vezes o papel é gardanapo.
E vamos em frente, atrás vem gente!... Ehahuheheheh.
Beijinho e abraços.
Daniel
Nanda Assis
Como gosto de partilhar e aprender, passa sempre.
A vida não será fácil, mas nós temos de a conduzir, procurar o nosso jeito, sempre sonhando com um amanhã melhor.
Agradeço, com beijos,
Daniel
Carla
Tens os meus agradecimentos, sabes que gosto de te ver.
onsidero-te com beijos.
Daniel
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